Por Juracy
Nunes
A escavação da Cacimba do Engenho foi descrita no
capítulo 10, pg. 81 do livro SANGRIA DE RISCO de autoria deste articulista.
Um resumo do capítulo do livro e a imagem ao lado mostram o retorno da
cacimba no local em que antes era a parte mais profunda de um açude.
Conseguir ração e água para os animais nas
grandes secas foi e continua sendo mais difícil do que suprir as necessidades
alimentícias humanas.
Na seca de 1942 presenciei uma luta titânica de
vários homens, chefiados por meu pai- José Eleutério de Sousa, cavando a
terra a procura de água, para salvar animais morrendo de sede. Pedro
Paulino, Gaudêncio, Miguel Dudu, Romão Antônio Sebastião, Euzébio, Burito
(este ainda vivo), Zé Cunca, são nomes de pessoas que participaram da cavação
do que foi chamado Cacimba do Engenho localizada no Sítio Mocó-
município de Monteiro no Estado da Paraíba.
Na época não existia na região trator ou outras
máquinas que facilitasse o trabalho que era feito à mão e utilizando animais
para o transporte da terra.
Era um serviço pesado e tinha por finalidade
socorrer um rebanho de dezenas de animais do Sítio Mocó e de outros sítios
vizinhos.
A ferramenta básica era picareta e pá. Uns
cavavam, outros jogavam a terra para fora do buraco. A dificuldade aumentava
à medida que se tornava mais profunda a escavação. A vala tinha a forma de um
retângulo de 4x2m e a profundidade a ser alcançada era dúvida para todos. A
que distância da superfície a água seria encontrada?
Eu aos seis anos de idade acompanhava de perto o
serviço, sentado à sombra de um juazeiro e levava para os trabalhadores água
fria em canecos de flandres, retirada de um pote de barro. A cada instante me
pediam mais água. Eu não entendia porque tanta sede. Só anos depois conheci
os termos desidratação e insolação condições adversas a que estavam
submetidos aqueles trabalhadores.
A terra retirada da escavação era jogada na
ribanceira, surgindo a necessidade de transporte dessa terra para local
afastado, tarefa que ocupava outras equipes formadas por carreiros e bois que
puxavam a terra no couro de arrasto. Essa expressão designava a pele não
curtida de uma rês bovina, amarrada por cordas à canga de uma junta de bois
que arrastava a carga, guiada por homem que habitualmente trabalha com carro
- de- bois por isso era chamado carreiro.
O serviço se prolongou por semanas seguidas. O
trabalho de cada dia começava com o esgotamento da água que minava das
laterais e se acumulava no fundo do poço. As primeiras latas d’água eram
colocadas no pote, era a água de beber que eu servia aos trabalhadores
durante o dia.
Havia dois fatores que nutriam a esperança de
descobrir água. Os mais velhos tinham noticias através dos antepassados da
existência naquele local de uma cacimba com fartura de água, e, durante a
escavação era crescente o volume de água que juntava no fundo do buraco a
cada noite que passava. Esse era um fato inconteste que prenunciava êxito.
Um dia chegaram os trabalhadores e o buraco
estava cheio de água. Alguém gritou “a veia mestra se destampou”. Um dos
homens saltou dentro com roupa e tudo, seu chapéu de palha boiou e em
segundos emergiu com um punhado de lama na mão que jogou nos companheiros.
Todos se abraçaram, comemorando a vitória da água
contra a sede. Começou no mesmo dia grande afluência de pessoas da vizinhança
que vinham apanhar água para consumo humano e dos animais. Tiravam água em
latas amarradas com uma corda, enquanto era concluído o serviço para a fonte
ficar com a estrutura de bebedouro disponível para todos os fins
principalmente para o consumo dos animais.
Os serviços complementares foram feitos: a rampa,
as cercas e os paus do bebedouro foram assentados e liberados a água para
múltiplos usos de 1942 até 1944 quando houve um bom ano de inverno não sendo
mais necessária a utilização do bebedouro. A fonte d´água ficou conhecida por
Cacimba do Engenho porque bem próximo existia um velho engenho de rapadura
movido a boi, que pertencera a meu avô paterno - Capitão Albino Alves de
Sousa.
Nesse local hoje existe hoje o açude Maria
Nunes. O açude foi construído em 1981 e sangrou pela última
vez em 2009. Quem conhece a adversidade do clima semiárido, se acostuma com a
evaporação perversa das águas dos reservatórios e sabe que seja a
cacimba ou o poço artesiano não podem ser esquecidos. Com a seca de
2012 o açude secou e nova cacimba foi aberta para reforçar o suporte d’água
oriundo dos poços profundos.
Desta feita a escavação foi realizada com
máquinas. A água foi encontrada a 3m de profundidade e o serviço teve
duração de 10h utilizando uma escavadeira chamada PC e três caçambas para
transporte da terra. Animais domésticos e silvestres já fazem a festa com a
nova fonte hídrica. Fotografia anexa.
Juracy
Nunes é médico e pequeno produtor rural em Monteiro/PB.
E-mail: juracysnunes@gmail.com
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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
A volta da cacimba
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